quinta-feira, 3 de junho de 2010

A crônica de um cabritinho voador



Lembro perfeitamente de uma conversa que tive no começo do ano passado, quando um conhecido disse que depois que o Jadson André entrasse para o WT dali não sairia tão cedo, e daria muito trabalho aos os grandes.

Na hora, discordei. A impressão que eu tinha deste surfista nascido no Rio Grande do Norte era a de que ele seria mais um nordestino especialista em provas do WQS, com pouco estilo e muita raça. Ledo engano, graças a Deus.

Minha opinião sobre ele começou a mudar logo no primeiro campeonato de 2010. Uma excelente atuação em sua estréia na elite, na Gold Coast, e outra ainda melhor, em Bells (tudo bem, foi tudo menos Bells, mas, enfim...) abriram meus olhos e passei a observá-lo melhor, apesar do desempenho de seus conterrâneos que passaram pelos Top-45 me deixarem com um pé atrás.

Mas a etapa brasileira estava ali para colocar meus dois pés na frente. Passei a defender o nome de Jadson André na frente de quem ousasse falar mal do moleque. No meu bolão, a desconfiança continuava e o potiguar não passaria da 3ª fase, sendo eliminado pelo experiente Damien Hobgood. Coitados de mim e do yankee. Não deu nem para o começo e Jadson simplesmente humilhou o adversário, colocando-o em combinação.

O mesmo aconteceu na rodada seguinte, dessa vez contra o aussie Luke Munro. E foi nessa hora que uma colega que assistia ao campeonato - e que por sinal não entende nada de surfe - jogou no ar: “Imagina se ele ganha? Vou apostar no garoto”.

Não sabe de nada, pensei. Deixou a emoção superar a razão. Mas, muitas vezes o surfe não segue regras e, talvez, seja este o motivo pelo qual ele seja tão apaixonante.

As quartas de final foram emocionantes. A partir dali, comecei a pensar como a colega: quem sabe, não seria a vez dele? Por que não?

Faltando pouco tempo para o término da bateria, o taitiano Michel Bourez estava com a faca e o queijo na mão e Jadson precisava de duas notas para virar o jogo. Virou!

O resultado só saiu quando o surfista já estava do lado de fora, junto da galera, que vibrou sem parar por mais de cinco minutos. Ali, não foram apenas manobras. Teve um pouco mais. Teve garra, dedicação e estratégia. Aliás, sem esses três fatores, você não se destaca entre os melhores do surfe.

E sabe qual o que é mais legal? Jadson continuou humilde, ao contrário de muita gente, que passa duas baterias e já se acha o dono do mundo.

A cada novo duelo, novas surpresas. O queridinho da mídia, o yankee Dane Reynolds - cheio de adesivos na prancha, vídeo de surfe com o seu nome e 300 aparições em capas de revistas -, também não conseguiu nada. Até que ele tentou, tirando duas boas notas, mas Jadson estava mesmo iluminado e voou rodando direto para a final, literalmente.

Do outro lado, estaria ninguém menos que o mito, a lenda, o eneacampeão mundial, Robert Kelly Slater. Aliás, não teria tanta graça se fosse qualquer outro. No ano passado, o cara estragou a festa dos brasileiros ao derrotar Adriano de Souza, também na decisão. Mas, como diz o ditado, vingança é prato que se come frio.

“O que eu posso fazer se ele é nove vezes campeão mundial?” indagou o Jadson, logo após sua grande vitória.

O que ele poderia fazer foi feito: aéreo pra cá, batidas e rasgadas para lá, muita vibração e o merecido banho de champagne nos braços da torcida. Um sorriso puro e gratuito, de quem parece estar se divertindo.

Talvez seja um pouco disso que nos falte diariamente.

Como ele mesmo disse, o cenário parecia o de uma final de um jogo de futebol. Nada mais sugestivo, já que o triunfo foi de um dos nossos, em uma de nossas praias e em ano de Copa do Mundo.

O moleque me conquistou. Jadson André é especial! Parabéns, de coração!